Tecendo Memórias
Enquanto observo no rio, pessoas se divertem com a energia da juventude. Dois deles encorajam um terceiro a enfrentar um desafio, instigando-o a superar limites. Como uma onda de determinação aquela provocação adentra meu ser. A atmosfera se mistura com uma sensação tranquila de introspecção e alivio da vida. Compreendo que, apesar da amizade, cada um de nós carrega uma parte íntima e única da sua jornada.
As águas que fluem à minha frente parecem mais guardar segredos de experiências passadas. Cada segundo que transborda carrega muita história, cada instante é uma peça preciosa no quebra-cabeça da vida. E mesmo assim, mesmo com múrmuros e risos ao vento, ainda há um terceiro que são o som da natureza, um estranho barulho silencioso que atravessa a solidão e nós mantem conectados a contemplação.
A vida é um espaço sagrado que nós mantêm sobre atenção plena e explora maneiras de tirar completamente nosso juízo.
É fascinante entender como momentos nós moldam e como lembranças se entrelaçam com a nossa própria identidade. Um cenário severo. Dá para notar que somos feitos de histórias, de fragmentos de tempo que se solidificam em memórias e momentos.
Cada desafio enfrentado é uma lição ultrapassada.
Afinal, a vida é uma dança entre a introspecção e simpatia, uma sinfonia de atitudes bem elaboradas e respeitosas sempre colocando o outro a sua frente, que por sua vez coloca outros e outros.
Talvez a missão seja se tornar alicerce da nossa própria construção interior.
Assim, diante do rio, permito-me mergulhar nas profundezas da essência de ser e existir, abraçando a beleza dos frames que passam como as águas do rio, sem pausa ou interrupções, para sempre constante.
Entre Flores e Segredos
Capítulo 1: “A Estufa da Senhora Leocádia”
A velha senhora Leocádia passava suas manhãs na estufa, o coração pulsando em sincronia com o verde exuberante que a cercava. Ali, em meio ao aroma adocicado das flores em flor, ela encontrava refúgio do mundo que parecia tão cruel lá fora.
Seus dedos enrugados deslizavam suavemente pelas folhas das Nepenthes, cada toque uma carícia amorosa às suas protegidas. As plantas, suas companheiras silenciosas, pareciam compreender as palavras não ditas de Leocádia, oferecendo consolo nas horas de tormenta.
As orquídeas pendiam em cascata, enfeitando os cantos da estufa com uma profusão de cores e formas, enquanto as samambaias se erguiam majestosas, criando um delicado véu de folhagem que dançava com a brisa suave. Dente de leão, com sua simplicidade e resistência, erguia-se ao lado da imponente flor do deserto, uma explosão de pétalas em tons de rosa e carmesim.
No entanto, era a Nepenthes que verdadeiramente roubava a cena, suas folhas enormes e cilíndricas dominando o espaço. De cada uma delas pendia uma armadilha mortal, pronta para capturar presas incautas. Era um espetáculo impressionante, a coexistência pacífica de beleza e perigo.
Enquanto o sol atingia o seu zênite, Leocádia emergia da estufa, os ombros curvados sob o peso do tempo. Nas ruas tranquilas do antigo bairro, ela se esforçava para manter a aparência de uma senhora gentil e serena. Cumprimentava os vizinhos com sorrisos calorosos e palavras amáveis, mas no fundo de sua mente, as queixas sussurravam como um murmúrio constante.
“Eles não entendem”, pensava Leocádia, olhando ao redor, observando os rostos passarem. “Não sabem o que é carregar o fardo do passado, o peso das escolhas que não tive. Culpa deles, culpa do tempo.”
No entanto, por trás da fachada de tranquilidade, Leocádia guardava um turbilhão de emoções. A solidão, muitas vezes, era sua única companheira verdadeira. Às vezes, ela imaginava que as plantas a entendiam melhor do que qualquer pessoa. Elas não julgavam, apenas acolhiam.
À medida que o crepúsculo tingia o céu de tons dourados, Leocádia retornava à sua estufa, onde o mundo parecia desvanecer. Ali, entre as sombras alongadas das plantas, ela encontrava consolo para a alma cansada.
Na penumbra, Leocádia sussurrava para suas plantas, compartilhando segredos que nunca ousara revelar ao mundo. “Vocês são minha fortaleza, minhas confidentes. Com vocês, posso ser eu mesma, sem máscaras, sem julgamentos.”
E assim, a senhora Leocádia encontrava seu equilíbrio frágil entre a realidade que enfrentava e o refúgio que a estufa lhe proporcionava. Um santuário de vida em meio à sua jornada solitária, onde as queixas podiam ecoar livremente, sem julgamentos. Ali, Leocádia encontrava a paz que buscava, pelo menos por um breve momento, antes de enfrentar o mundo novamente, sempre com a determinação de uma senhora gentil e serena, ocultando suas dores sob a fachada da calma e paciência.
#Continua
2 anos ago Conto, Ficção, Romance • Tags: drama, flores, segredos, solidão, suspense, velhice